A importância da estrutura e dinâmica do cão para o Agility
O Agility é uma modalidade
esportiva cuja particularidade é a interação entre
o ser humano e o cão. Como todo esporte, o exercício do agility
pode ser feito de duas formas: hobby ou competição.
Para os que encaram como competição,
o caminho da vitória não é fácil, existem diversos
fatores a serem trabalhados, alguns relacionados ao condutor (técnica
de condução, memorização e etc.) e outros ao
cão (treinamento, saúde, selecionamento genético,
escolha do exemplar e etc.). Não existe mágica, existe conhecimento
aplicado para tudo. Quanto mais se estuda, mais se aprimora cada detalhe
e se consegue alcançar o objetivo numa competição:
Ganhar!
Para os que encaram como hobby, é
importante saber as limitações estruturais do seu cão,
afim de não causar injúrias que possam levar ao sofrimento.
Afinal o objetivo em um hobby é a diversão, tanto para o
ser humano como para o ser canino.
O detalhe que quero chamar a atenção
nesta série de artigos é como a estrutura do cão pode
interferir em seu desempenho.
Existe somente uma anatomia para a
espécie canina, ou seja, mesmo números de ossos, músculos
e tendões. Porém dentro dessa anatomia possuimos diversas
variações. As combinações das diferentes angulações
de articulações, formatos osséos e desenvolvimento
muscular permitem termos diferentes tipos de estruturas osséas,
e consequentemente distintos tipos de movimentação.
Estruturas
São variações
dentro da mesma anatomia
Variações
Estruturais>> |
- angulações
das articulações
- formatos ósseos e cartilagem
- desenvolvimento muscular |
A estrutura determina o movimento,
diferentes estruturas resultam em diferentes movimentos, e o ser humano
se aproveitou dessa variações. O cuidadoso selecionamento
de milhares de anos, nas variações estruturais, no temperamento,
na exterioridade (pelagem, cores, orelhas e etc) permitiu termos cães
que são especializados em diversos trabalhos, como cães que
caçam em tocas, cães para companhia, outros que recolhem
a ave abatida na água, cães de tração, cães
que caçam javalis, outros tigres, cães que pastoreiam gado
e outros mini ovelhas. São mais de 360 raças oficialmente
reconhecidas, cada qual com sua função de trabalho especifico.
Nenhuma raça canina foi selecionada
genéticamente para o Agility, simplesmente estamos adaptando as
raças existentes que mais se adequam a este esporte. Nem todas as
raças deveriam praticar e muito poucas raças podem ser competitivas,
essa é a realidade.
Para exemplificar uma das diferenças
estruturais, irei me focar na angulação do posterior de duas
raças: Border Collie e Retriever do Labrador
O Border Collie é uma
raça de pastoreio. Para o correto exercício de sua função
é necessário cobrir distâncias no solo com a maior
eficiência possível. Somente um posterior com angulações
mais fechadas permite uma maior amplitude do passo em um único movimento.
O Retriever do Labrador é
uma raça de coleta (a caça abatida que cai na água).
Para o exercício de sua função é necessário
cobrir distâncias dentro da água com a maior eficiência
possível, sendo necessário ter peso corporal (lastro) e músculos
potentes, necessitando articulações mais retas entre os ossos,
a fim de manter a estabilidade corporal. Seu posterior com angulações
mais abertas faz com que tenha menor amplitude do passo.
Border e Labrador exercendo o mesmo
trabalho: AGILITY

O Border Collie possui mais alavanca
(extensão) e propulsão para um salto (ou passo) que um labrador.
Numa linha reta, o Border começa o salto muito antes devido à
capacidade de projeção da suas angulações.
Não é porque o Labrador é mais pesado, que ele salta
de forma mais lenta, derrubando mais saltos e telhas, simplesmente suas
angulações são mais retas. Não adianta emagrecer-lo,
a ponto de ficar pele e osso para poder saltar melhor: sua estrutura sempre
será de um cão pesado por mais magro que esteja, as angulações
não irão mudar.
Importante ressaltar que dentro
da mesma raça existem exemplares diferentes. Cada raça possui
seu padrão detalhado para o correto exercício do trabalho
para o qual foi selecionado. Todos os padrões estão no site
da Confederação Brasileira de Cinofilia (www.cbkc.com.br
).
Nem todo Border Collie segue corretamente
o padrão da raça, podemos ter um Border cujas angulações
sejam erroneamente como as de um Labrador. Entender quando o exemplar está
com desvios enquanto ao padrão é fundamental. Dificilmente
existirá um exemplar completamente dentro do padrão, sempre
vai haver algum detalhe que desvie, como variações de angulação
fêmur-tibio-patelar, formato de costela, tipo de olhos, tamanho do
jarrete, formato dos pés, pelagem, orelhas e etc.
Porém existem desvios mais
graves e outros menos. Para um cão de pastoreio, erros estruturais
que afetam a dinâmica do movimento são mais graves. Para um
cão de companhia, erros de beleza como a textura da pelagem ou a
cor são mais graves que os de estrutura. O padrão não
é feito para ser levado em consideração somente numa
exposição de beleza, alías nome bastante inadequado
para essa atividade, o correto seria dizer exposição de conformação.
O padrão de raça foi feito para que todo o árbitro,
criador e expositor o respeitem. Ele determina o correto exercício
da função selecionada pelo ser humano para essa raça.
O praticante de agility também precisa começar a entende-lo.
EXEMPLOS DE DESVIOS NA RAÇA
PASTOR ALEMÃO
Para os que praticam Agility com cães
sem raça, analisando a estrutura de seu cão e possível
avaliar o potencial de seu exemplar. Existem certas “estruturas mais propícias”
para a prática do Agility.
Ao examinar o seu cão (com
ou sem raça) e saber o que não está correto em termos
estruturais, pode-se, em certos casos, melhorar a dinâmica do movimento
através de um treinamento adequado ou um condicionamento muscular
direcionado. Certos erros estruturais também são passíveis
de causar lesões corporais graves ao longo do tempo de prática
de agility, por isso o trabalho de fisioterapia preventiva é importantíssimo
nesses casos.
Analisando somente o metacarpo, região
de extrema importância no Agility. Um Border Collie de 20 kg, com
velocidade de 5 m/s, após o salto pode sofrer na região um
impacto de 100 kg/cm2.(calculo efetuado pelo físico M.Moraes, condutor
da Juju). Lembrando que por centésimos de segundo, esse impacto
somente se focará numa pata.
Podemos
ter diversas angulações de metacarpo em relação
ao solo, porém para a pratica do Agility o ideal é ligeiramente
inclinado (1). No padrão da maioria das raças de pastoreio
(como o Border Collie) é exigida essa angulação. O
exemplar que segue o padrão não terá problemas durante
a prática do Agility, caso o exemplar tenha o metacarpo erroneamente
muito inclinado (2), ocorrerá uma lesão óssea ou articular
a longo prazo na região carpiana que incorretamente sofrerá
o impacto. No caso de cães com o metacarpo muito reto (a maioria
das raças Terriers), o impacto será amortizado incorretamente
na art. umero-radio-ulnar (cotovelo) Este dois exemplos são
casos no qual é importante efetuar o condicionamento muscular para
evitar a injúria.
Pior do que o salto, teremos a curva
para os cães que possuem o metacarpo muito inclinado. Na situação
de alta velocidade dentro do túnel em curva, aonde na dinâmica
do movimento se projeta a pata para dentro, é muito mais fácil
ocorrer situações de injúria devido a torção
do metacarpo. No momento que o cão pisa, ele já está
virando o corpo para o próximo passo e o metacarpo que inclinou
demais atrasa a retomada do passo e pode sofrer a injúria. Para
um cão de metacarpo muito reto, devido a sua falta de flexibilidade
somente ocorrerá a perda da velocidade.
Dentro da estrutura canina, temos
diversos fatores para analisar, como proporções corpóreas,
formatos ósseos, angulações (das art. fêmur-tibio-patelar,
art.escapulo-umeral, art. umero-radio-ulnar, pelvis, art. tibio-tarsiana,
art.metatarsiana e etc.). Como já escrevi, da estrutura depende
o movimento. O Agility é mais que um esporte, é uma engenharia!
Por M.V. Maria del Rocio Nadal
· Médica Veterinária
exercendo clinica de Cães e manejo reprodutivo/ genético
para canis.
· Arbitro Internacional de
todas as raças pela F.C.I – C.B.K.C
· Responsável técnica
da FECESP junto ao ministério da agricultura, pelo serviço
de registro
· Diretora de criação
da Associação Paulista do Chow Chow
· Diretora técnica
do Poodle Clube Paulista
· Criadora de Boston Terrier
e praticante de Agility |